Falando-lhes como um irmão – preocupado como estou – que se deteve a estudar esse assunto em profundidade, a fim trazer-lhes um posicionamento seguro a respeito destes questionamentos, quero dizer-lhes que a argumentação antes apresentada – que compara as falhas do preservativo com as das vacinas do sarampo, ou da pólio, por exemplo – não é consistente, por duas razões: a primeira, porque os vírus da pólio e do sarampo não se podem evitar: atacam em qualquer momento, transmitem-se pelo ar que se respira, pela água que se bebe, pelo alimento que se come ou pelo contato habitual do relacionamento social ... A Aids, não: transmite-se fundamentalmente pelas relações sexuais. E ninguém é obrigado a praticá-las com uma pessoa que não se conhece em profundidade, da mesma maneira que se é obrigado a comer, a beber, a respirar ou a relacionar-se socialmente ... A segunda, porque, no caso dos preservativos, a propaganda recomenda o uso como se as relações promíscuas fossem “normais”, inócuas, inevitáveis, ou até recomendáveis. Essa é a feição que têm as propagandas que às vezes aparecem: “aproveite o carnaval, mas use ‘camisinha’”. Aceita-se um pressuposto inadequado – a promiscuidade – e inclusive incentiva-se a mesma : “não se iniba, divirta-se, mas – cuidado! – use ‘camisinha’”.
A propaganda, em geral, não faz nenhuma advertência, não entra em sutilezas, simplesmente incita a usar a “camisinha”, fomentando o que este uso traz consigo: uma relação eventual e insegura. É um meio que, sem dúvida, convida ao desregramento sexual. Desregramento sexual. Desregramento sexual este que traz consigo muitos inconvenientes: o enfraquecimento da saúde e da força da vontade, a perda de um comportamento social e profissionalmente correto, a falta de respeito à pessoa humana e, sobretudo, a infidelidade conjugal e a gravidez precoce, da qual não poucas vezes deriva o aborto.
A mentalidade permissivista pode aceitar-se teoricamente, porém, quando na prática nos afetam pessoalmente, é bem diferente. Pode-se defender o “sexo livre”, mas ninguém aceita que a sua esposa, ou o seu marido, tenha relações com um terceiro. Pode-se, intelectualmente, ser favorável às relações sexuais pré-matrimoniais, mas ninguém gosta de que uma filha de quinze anos fique grávida, ou que um filho de quatorze anos seja pai. O fim bom não justifica utilizar meios perversos. Quem aceitaria montar uma escola para ensinar aos pivetes de rua a roubar sem matar ? Alguém alegaria que o fim é excelente: evitar muitas mortes. Mas os meios utilizados são péssimos.
Evitar o pior não justifica consentir no que é mau. Evitar a Aids é ótimo mas fomentar a promiscuidade é péssimo. Não estaremos utilizando um inibidor para a Aids – o preservativo – que, em última análise, pode se tornar causa desta mesma doença ? Descuida-se a educação dos adolescentes para a efetividade e a vida sexual sadias, lamenta-se o uso precoce do sexo e a gravidez das adolescentes e, de repente, “a toque de caixa”, põe-se nas mãos dos menores um pacote de preservativos como que dizendo: “fique bem à vontade, a ‘camisinha’ garante”. É igual a querer pagar um incêndio com gasolina! E depois chamam de irresponsável a quem dá um grito de alerta.
O “slogan” da “camisinha” que foi anunciado num conhecido programa de televisão é este: “Pecado é não usar camisinha”. É difícil inventar uma tão ardilosa falácia. “Pecado é não usar ‘camisinha’” , mas não é pecado trair a esposa, usando camisinha; não é pecado o desregramento sexual porque se usa “camisinha”; não é pecado deflorar uma menina porque se usa “camisinha”; não é pecado perverter menores incitando-os a usar “camisinha”; não é pecado desfigurar a imagem do Brasil, que tem tantos valores, apresentando-o como o país da libertinagem, das mulheres fáceis, das bacanais de carnaval ...
Se uma campanha gastou tempo para inventar esta “sutileza”, o que poderemos esperar no desenvolvimento da mesma campanha? A Igreja simplesmente aconselha a ter um comportamento decente – porque, não o esqueçamos, a questão consiste em ser simplesmente decente – e deixa a liberdade para que as pessoas tomem a atitude que desejarem: não faz campanha . Não tem milhões para fazer propaganda. Não pressiona a opinião pública dessa maneira. Mas tem que suportar o peso fabuloso que representa para a opinião pública programas de televisão caríssimos. Nós perguntaríamos : quem realmente comete o pecado ? Por que esse interesse em denegrir a imagem da Igreja ? Não será por medo de que a atitude transparente dEla desperte a consciência dos cidadãos? Será necessário gastar milhões para tentar convencê-los : “Não, não há pecado quando se usa ‘camisinha’”. A Igreja não pretende admiração. A Igreja o que pretende é respeito.
As ações que facilitam a propagação de uma doença são eticamente reprováveis. E os atos que desumanizam o sentido da sexualidade são igualmente reprováveis. João Paulo II assim se expressou: “ o uso dos preservativos acaba estimulando, queiramos ou não, uma prática desenfreada do sexo”.
Podemos inibir-nos às vezes, queridos irmãos e irmãs, mas é preciso ter a coragem de dizer as verdades aos filhos, à sociedade e ao Estado; não existe sociedade estável sem família bem constituída; não há família bem constituída sem fidelidade conjugal; e não há fidelidade conjugal sem a educação da afetividade e do sexo, sem autocontrole. E quando não há autocontrole, o que fazer ? A OMS e o Ministério da Saúde advertem: Não é para se preocupar: use a “camisinha” ! A “camisinha” soluciona todos os problemas ... Perguntamos: a “camisinha” protege das crises conjugais, do sexo prematuro tão perturbador para tantos menores de idade, da delinqüência juvenil e das conseqüências naturais da desestruturação do lar ? Sabemos muito bem que a questão não consiste em curar os efeitos; é preciso suprimir as causas. Não se soluciona o problema profilático da água colocando um filtro em cada torneira, mas purificando a água na fonte, no reservatório. Não se encontra o remédio na “camisinha”, mas na mudança de atitude: um verdadeiro trabalho educativo no qual a Família, o Estado e a Igreja têm que envidar os mais vigorosos esforços.
Não, não é com preservativos que se solucionarão os problemas do desregramento sexual, mas com um trabalho profundo que venha a colocar no lugar que merece o valor da vida, do amor, do sexo, do matrimônio e da família.
E é nessa empreitada que está metida a Igreja. A Igreja não nega o óbvio. A Igreja reconhece o óbvio – a realidade – mas esforça-se por superá-la. Talvez seja a única entidade, em nível mundial, que tem a coragem de chamar as coisas pelo seu verdadeiro nome. E talvez seja por essa razão que é tão duramente criticada: a luz alegra os olhos sadios e fere os que estão doentes.